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O dano existencial conforme o posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho

Por Evelyn Ceccon - 19/08/2022

Advindo inicialmente de uma criação jurisprudencial e doutrinária, o dano existencial se materializa quando o trabalhador sofre limitações em sua vida particular por ato ilícito do empregador, impossibilitando-o de estabelecer relações sociais, recreativas, culturais, esportivas, afetivas, familiares ou mesmo de desenvolver seus projetos de vida, de cunho profissional, social e pessoal.

De acordo com José Affonso Dallegrave Neto, o dano existencial, no conceito elaborado por Amaro Almeida Neto, corresponde a "violação de qualquer um dos direitos fundamentais da pessoa, tutelados pela Constituição Federal, que causa uma alteração danosa no modo de ser do indivíduo ou nas atividades por ele executadas com vistas ao projeto de vida pessoal”. (NETO, José Affonso Dallegrave, Responsabilidade civil no direito do trabalho, 6ª ed., São Paulo: Ltr, 2017).

O dano existencial normalmente está atrelado à imposição de jornadas de trabalho exaustivas, labor reiterado em dias de repouso semanal remunerado e feriados, ausência de fruição de férias por longos períodos e outras circunstâncias que afetam diretamente os projetos de vida do trabalhador e suas relações fora do ambiente laboral. 

Em uma dimensão mais ampla, o instituto visa a salvaguardar os direitos sociais mínimos previstos na Constituição da República, dentre eles o direito ao lazer (que compreende a desconexão do trabalho), à saúde e à convivência familiar (art. 6º da CRFB/88).

A Lei 13.467/2017 acrescentou na Consolidação das Leis do Trabalho a possibilidade de reparação pelo dano existencial, ao prescrever que “causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica” (art. 223-B). 

No que diz respeito a prova, o reconhecimento do dano existencial in re ipsa, ou seja, baseado na conduta ilícita do empregador que, dada a sua gravidade, por si só, enseja presunção de um dano, tem ocorrido em casos excepcionais.  

Nessa linha de interpretação, o Tribunal Superior do Trabalho já decidiu que a prática de jornada de trabalho de 15 horas diárias, “decorre de conduta ilícita praticada pela reclamada, que não observa as regras de limitação da jornada de trabalho, restando patente a existência de dano imaterial in re ipsa, presumível em razão do fato danoso” (TST – Autos nº1351-49.2012.5.15.0097, 2ª Turma - Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, data de publicação no DEJT 15/03/2019).

A jurisprudência daquele Tribunal, no entanto, tem adotado esse entendimento em casos pontuais, prevalecendo a exigência de prova de um evento prejudicial concreto.

Ao apreciar as pretensões alusivas ao dano existencial, o Tribunal reconhece que “embora a possibilidade, abstratamente, exista, é necessário que ela seja constatada no caso concreto para que sobre o indivíduo recaia a reparação almejada” (TST – Autos nº 4026120145150030, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira De Mello Filho, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação no DEJT 27/11/2020). E recentemente decidiu que mesmo “reconhecido judicialmente a não fruição de férias pelo interregno de 14 anos, não é suficiente para ensejar o deferimento da indenização por dano existencial, sendo imprescindível, na hipótese, a demonstração inequívoca do prejuízo, a necessária evidência de que o inadimplemento contratual tenha provocado outros fatos que venham a abalar os direitos de personalidade do trabalhador” (TST – Autos nº 255901320175240091, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues - Data de Publicação no DEJT 24/06/2022).

Conclui-se que a pretensão indenizatória voltada à reparação do dano existencial, à luz da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, deve estar lastreada em provas dos prejuízos causados pelo ato ilícito do empregador, capazes de frustrar, de forma concreta e     claramente aferível, os projetos de vida e as relações sociais do trabalhador, admitindo-se, somente em caráter excepcional, a presunção do dano, mormente naqueles casos de gravidade e intensidade da conduta ilícita do agressor.  

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