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Impenhorabilidade de Aplicação Financeira
Por Geandro Luiz Scopel - 10/06/2022
Muito se discute quanto a penhorabilidade ou impenhorabilidade de valores em aplicação financeira. O Código Processo Civil em seu artigo 833, inciso X, prevê como impenhoráveis os valores a 40 salários-mínimos depositados em caderneta de poupança – Art. 833 – São Impenhoráveis: X – a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos.”
Contudo, em recentes decisões o Superior Tribunal de Justiça ampliou a aplicação do referido dispositivo legal, no sentido de serem considerados impenhoráveis valores inferiores a quarenta salários-mínimos também em contas de outra natureza (corrente, investimento, outras), vejamos:
“(...) REGRA DE IMPENHORABILIDADE. VALORES ATÉ 40 SALÁRIOS MÍNIMOS DEPOSITADOS EM CONTAS BANCÁRIAS. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES.
1. São impenhoráveis os saldos inferiores a 40 salários-mínimos depositados em caderneta de poupança e, conforme entendimento do STJ, em outras aplicações financeiras e em conta-corrente. Precedentes.” (AgInt no REsp n. 1.812.780/SC).
As decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça quanto a interpretação ampliada da impenhorabilidade do inciso X do art. 833 do CPC são no sentido de ser reserva única e pessoal de emergência para subsistência do devedor e sua família desde que “ressalvado eventual abuso, má-fé, ou fraude, a ser verificado caso a caso, de acordo com as circunstâncias da situação concreta em julgamento.” (STJ, REsp 1.230.060/PR, DJe 29/08/2014).
Tal entendimento encontra-se sumulado também pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, prevendo que “É impenhorável a quantia depositada até quarenta salários mínimos em caderneta de poupança (CPC/2015, art. 833, X), bem como a mantida em papel moeda, conta-corrente ou aplicada em CDB, RDB ou em fundo de investimentos, desde que seja a única reserva monetária, e ressalvado eventual abuso, má-fé, ou fraude.” (Súmula nº. 108)
No ponto, a doutrina leciona que “esse valor de quarenta salários mínimos passa a ser visto como um montante com função de segurança alimentícia ou de previdência pessoal e familiar” (Humberto Theodoro Júnior, in A reforma da execução do título extrajudicial. Editora Forense: Rio de Janeiro, 2007. p. 53).
Nesse sentido, ao analisar a regra processual da impenhorabilidade de reserva financeira, observa-se que sua razão de existir guarda congruência e direta relação de proporcionalidade com a manutenção do mínimo existencial do devedor, o que não se altera pela escolha que faça quanto à aplicação financeira escolhida.
Oportuno pontuar que longe de comprometer a eficácia da execução, a extensão da impenhorabilidade dos 40 salários-mínimos para as demais aplicações financeiras além da caderneta de poupança significa assegurar parcela mínima do capital em favor do devedor, garantindo a eficácia da opção legislativa de permitir a manutenção de reserva monetária.
Por fim, a impenhorabilidade pode ser relativizada quando constatado o desvirtuamento da reserva financeira (intenção de poupar), ou seja, com assunção de características de conta corrente por essência, em razão de saques, retiradas, realização de pagamento de compras com cartão de débito e boletos, transferências, e consecutivas oscilações, “não há que se falar em impenhorabilidade de quantia depositada até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos.” TJSC, AI n. 0155422-03.2015.8.24.0000, J. 18/10/2016, e desde que evidenciada a intenção de frustrar credores, já que “a simples movimentação atípica (...) por si só, não constitui má-fé ou fraude a ensejar a mitigação da impenhorabilidade (...).” (STJ, REsp n. 1.765.956/SP, DJe. 15/05/2019.
Conclui-se, portanto, que é imprescindível a análise sobre o caso em concreto, bem como as provas sobre eventuais movimentações bancárias e se estas teriam o condão de mitigar a impenhorabilidade.