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Cobrança indevida de ISS: cadastros indevidos e retenções descabidas

Por Renan Felipe Wistuba - 30/04/2021

O imposto sobre serviço de qualquer natureza (ISS ou ISSQN), como o nome sugere, é um tributo exigível pelos municípios brasileiros sobre a prestação de serviços.


Além do texto constitucional (art. 156, §3º), a Lei Complementar nº 116/03 fixa os parâmetros básicos que deverão ser seguidos pelas legislações municipais que possibilitarão cobrar o contribuinte pelo tributo sobre o serviço prestado.


Vale lembrar: (a) que o Brasil conta com mais de cinco mil municípios; (b) é corriqueiro que o prestador do serviço (contribuinte do ISS, segundo o art. 5º da LC 116/03) não limite sua atuação ao município de sua sede; (c) o costume de se privilegiar a ânsia arrecadatória; e (d) a tentativa de controle fiscal sobre os prestadores sediados em outros municípios gera diversas discussões sobre a sujeição passiva e ativa do tributo (quem paga e quem recebe o ISS).


A regra geral é prevista no artigo 3º da LC 116/03, isto é: “o imposto, devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador”.


No mesmo artigo constam atualmente vinte e três exceções em que o ISS passa a ser devido junto ao município do tomador do serviço (ou contratante) ou do local em que prestado o serviço. Apenas para exemplificar, excetuam a regra geral os serviços de construção civil (ISS devido no local da obra), de guarda ou depósito de bens e semoventes (ISS devido onde o bem estiver), dentre outros.


Apesar de regra e exceções estarem delimitadas na legislação balizadora do ISS, diversos municípios brasileiros criaram um mecanismo de controle chamado de “Cadastro de Empresas Prestadoras de Serviços de Outros Municípios” (CPOM) que visava a impor uma suposta obrigação acessória aos forasteiros (de se cadastrarem) e um dever de retenção do ISS na fonte aos tomadores de seus serviços (em caso de ausência do cadastro). 


Isto é, se o prestador de serviço não constasse da lista CPOM o tomador deveria reter o valor do ISS local, mesmo que aquele fosse sediado em outro município.


A medida se justificaria para proteger os prestadores locais e facilitar a fiscalização (já que o tomador do serviço está localizado no território municipal, enquanto quem prestou o serviço está em outro município).


Todavia, como o “contribuinte é o prestador do serviço” e o imposto é devido, em regra, na sede ou no domicílio do prestador do serviço (artigos 3º e 5º, LC 116/03), em diversas situações houve tributação em duplicidade da prestação do serviço.


Isso porque a retenção eventualmente feita pelo tomador de serviço (e repassada ao município em que prestado o serviço) não desobrigava o prestador de serviço a recolher o ISS no município de sua sede, o que gerou o recolhimento dúplice do imposto.


Assim, a imposição da obrigação de retenção do ISS na fonte, baseada na simples ausência de cadastro no CPOM viola expressamente o artigo 146 do Texto Constitucional, vez que a legislação municipal não é Lei Complementar para estabelecer “fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes” em matéria tributária. Veja-se que a medida, na prática, altera (a) o sujeito passivo do ISS, já que desloca do prestador para o tomador o dever de recolhimento; e (b) o critério espacial da incidência do tributo, isto é, altera o local em que a legislação expressamente atribuía a ocorrência do fato (gerador) que ensejaria a exigência do ISS.


Vale o seguinte exemplo: o prestador de serviços de refrigeração, sediado em Curitiba-PR, ao instalar aparelhos de ar condicionado em município do litoral paranaense, permanece contribuinte do ISS curitibano. Todavia, se o município litorâneo estabelecer a obrigação acessória de cadastro CPOM (da qual o prestador de serviço não tomou o cuidado de se cadastrar previamente) o contratante tem o dever de reter e recolher o ISS local, ainda que o mesmo serviço venha a ser tributado em Curitiba-PR.


Recentemente, o Supremo Tribunal Federal fixou o seguinte Tema em Repercussão Geral rechaçando o CPOM e o dever de retenção pelo tomador de serviços: “É incompatível com a Constituição Federal disposição normativa a prever a obrigatoriedade de cadastro, em órgão da Administração municipal, de prestador de serviços não estabelecido no território do Município e imposição ao tomador da retenção do Imposto Sobre Serviços – ISS quando descumprida a obrigação acessória” (Tema nº 1.020, STF).


Pontua-se que municípios como São Paulo e Curitiba têm em suas legislações específicas de ISS previsões inconstitucionais como as aqui tratadas. 

 

Ante o exposto e via de regra, o ISS é devido no município em que sediado o prestador de serviços (salvo as exceções do art. 3º da LC 116/03) e, segundo entendimento do STF, é inconstitucional a obrigação imposta ao tomador de serviço de reter o ISS sobre o valor da nota do prestador de fora de seu município (do contratante) caso este não esteja cadastrado no CPOM.

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