top of page

Artigos e notícias

Responsabilidade civil do Estado por acidente provocado por má conservação de rodovia 

Em recente julgamento proferido pela Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (APC 5009441-28.2016.4.04.7204/SC), o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) foi condenado a indenizar danos materiais decorrentes de acidente de trânsito ocorrido em rodovia federal.


No caso, o acidente envolveu um caminhão na BR-153, em Tocantins. O motorista afirmou que, em virtude da má conservação da rodovia e de diversos buracos existentes na pista, perdeu o controle da direção e veio a colidir com uma árvore. O DNIT contestou o pedido indenizatório e alegou que a causa primária do acidente teria sido o excesso de velocidade e a imprudência do próprio condutor.


Em sentença, reconheceu-se a existência de imperfeições na pista “a evidenciar que não era bom o estado de conservação da rodovia”, bem como “a falha no serviço de manutenção das condições da rodovia por parte do DNIT, que permitiu a existência de irregularidades e desníveis sobre a pista”. Daí adveio a responsabilização do ente público, sob o entendimento de que a má conservação da rodovia foi determinante para a ocorrência do sinistro.


Por outro lado, foi acolhida a alegação do DNIT de que houve imprudência do motorista, sob o entendimento de que seria presumível o tráfego em excesso de velocidade porque a proprietária do caminhão não apresentou o tacógrafo para demonstrar o registro da velocidade do veículo na ocasião do sinistro. Desse modo, foi reconhecida culpa também do motorista, pois, segundo a sentença, “a existência de desníveis e irregularidades, aliada à velocidade empreendida pelo condutor do caminhão da autora, foram as causas determinantes do acidente, levando ao reconhecimento da culpa concorrente”.


Nesse caso, três questões merecem destaque. 


A primeira é a responsabilidade objetiva do Estado amparada no art. 37, §6º da Constituição Federal. Se, no exercício do dever de manter e conservar as rodovias e as vias públicas, o Poder Público foi desidioso e negligente a ponto de não fiscalizar nem realizar (ou exigir, no caso de concessão à iniciativa privada) o conserto do buraco, não pode transferir à vítima os ônus dessa desídia e negligência, seja de manutenção ou fiscalização. Trata-se, pois, do chamado “ilícito omissivo próprio”, ante o comportamento omissivo da Administração nos deveres previstos em lei de manutenção e conservação das vias públicas, prevenir acidentes e zelar pela segurança dos cidadãos, razão pela qual deve ser responsabilizado independentemente da configuração do elemento culpa. 


A segunda é a presunção de culpa do motorista, pelo fato de não ter sido apresentado nos autos o tacógrafo do caminhão envolvido no acidente. Segundo a jurisprudência do TRF da 4ª Região, o tacógrafo configura o meio de prova adequado a elucidar a velocidade do veículo envolvido no sinistro (e até prevalecente sobre outras provas, como depoimentos de testemunhas), e a não apresentação injustificada dele faz recair, sobre o proprietário do veículo, a presunção suficiente “de que, no caso, seu veículo era conduzido em velocidade acima do permitido”, como constou da sentença.


A terceira é a culpa concorrente. Tratando-se de situação em que reste configurada a responsabilidade objetiva do Estado, mas também a culpa do motorista (por excesso de velocidade), aplica-se o disposto no art. 945 do Código Civil, segundo o qual “se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”. Nesse contexto, prevalece o entendimento de que é equitativa a culpa de cada parte (Estado e a vítima), cabendo, a cada uma delas, arcar com metade dos prejuízos.


Trata-se de entendimento dominante na jurisprudência, tanto que aquele Tribunal, em sede de apelo, reiterou que houve um “serviço público prestado de forma deficiente, que funcionou mal, pois sem dúvida a falta de conservação da rodovia foi uma das causas do evento danoso, o que faz recair sobre o DNIT a responsabilidade civil”, e que “a ausência de apresentação do tacógrafo implica culpa concorrente por presunção de que o motorista empregava velocidade incompatível para o trecho da rodovia, conforme os precedentes citados na sentença”.


 

bottom of page